terça-feira, 14 de outubro de 2025

ALQUIMIA E INICIAÇÃO

Por Draco Stellamare

Este texto foi escrito originalmente para os membros da Congrega Stella Maris, e integra o conteúdo de estudos obrigatórios dos aprendizes.

Esta versão pública foi devidamente editada com a retirada dos conteúdos internos.

 

Desenho de um livro

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

 

A alquimia é definida por muitos autores – sobretudo em âmbito historiográfico – como uma “proto-química”, em partes representando as ideias basilares que evoluíram para o entendimento da química moderna e em partes composta de teorias que hoje são consideradas ultrapassadas do ponto de vista científico. No entanto, falta ao olhar moderno – para além da compreensão de que toda arte se circunscreve às possibilidades de seu tempo – o entendimento de que muito além da parte materialista e laboratorial a alquimia é uma arte metafísica, psíquica e espiritual, num sentido iniciático. Os principais objetivos da alquimia eram a transformação do chumbo (e outros metais) em ouro, a criação do homunculus (o homem artificial) e a preparação da Pedra Filosofal, um insumo que possibilitaria o usuário a adquirir vida eterna, poder e cura para todas as mazelas. Tais objetivos considerados pelo cientista moderno como fantasias sobrepujadas possuem uma dimensão mistérica que continua muito relevante para os adeptos do esoterismo tradicional. Em nossa arte bruxa, os princípios alquímicos se relacionam estreitamente a diversas de nossas simbologias, ritos e mistérios. Sobretudo no curso do processo iniciático, considerando as influências e amálgamas do rosacrucianismo antigo e outros mistérios obscuros em nossa tradição, a sabedoria alquímica nos é relevante para compreender as fases pelas quais somos conduzidos no curso da trajetória espiritual que objetiva a deificação. Esse texto busca elucidar essa perspectiva.

O processo alquímico não foi estanque ao longo do tempo. Como as leituras indicadas já ensinaram, ele inicialmente era focado nos quatro elementos (e o espírito), sendo que somente com a alquimia europeia medieval-renascentista os quatro elementos começam a dar lugar a um protagonismo dos princípios alquímicos, que primeiro são dois – enxofre e mercúrio, oriundos respectivamente das exalações intermediárias entre terra e fogo (fumo terroso) e água e ar (vapor aquoso) – e depois em Paracelso ampliam-se em três: enxofre, mercúrio e sal. Tais princípios não são uma literalidade mas sim um conceito estrutural da realidade, todas as substâncias podem ser divididas, ou melhor, compreendidas em uma tríade de enxofre, mercúrio e sal. O primeiro desses princípios, enxofre, está ligado a tudo que é combustível, que sofre os efeitos da transmutação dentro da substância, podendo estar mais puro ou menos puro, e sendo encontrado como vermelho, branco ou negro. O mercúrio é o condutor e permeador, ele se mantém constante, embora fluido, entre os diferentes estados das substâncias. O sal é a materialidade, a forma física que contém e manifesta os outros dois princípios.

Sob uma ótica física, os princípios podem ser vislumbrados na decomposição de algo, como a madeira sendo queimada. Enquanto o enxofre é a parte consumida pelo fogo – por ser combustível, fornecendo energia para a queima – o mercúrio é a fumaça liberada para o estado de “vapor” e o sal são as cinzas resultantes. Já no entendimento espiritual e iniciático, compreendemos que os três princípios são símbolos e simetrias para a tripartição da existência humana: o mercúrio, imodificável e fluido, é o espírito imortal (para nós, o sagrado coração que contém o “fogo” espiritual ou quintessência, Azoth), o enxofre, consumível e sujeito às ações do alquimista, é a alma ou a mente afetada pelas emoções e instintos, e o sal, a materialidade, é o nosso corpo que permite a manifestação de ambos os princípios no nosso mundo material.

Em nossa tradição, vemos a tripartição destes princípios alquímicos colocada de forma subliminar nos nossos sacramentos rituais. [conteúdo editado]

Segundo os ensinamentos alquímicos, os metais são compostos por uma diferente composição dos dois princípios enxofre e mercúrio, em diferentes tipos de sal, contemplando maior pureza e equilíbrio ou maior impureza e desequilíbrio. Tais metais estão para nós associados não somente aos planetas, mas às esferas celestiais e aos poderes primordiais da criação, conforme contemplados também nas pontas de nossa estrela sabática.

Chumbo = Saturno

Ferro = Marte

Estanho = Júpiter

Mercúrio = Mercúrio

Cobre = Vênus

Prata = Lua

Ouro = Sol

Excetuando o mercúrio que não se fixa em estado sólido em condições normais, os metais citados são assim mencionados por Alberto Magno quanto à sua composição:

Chumbo = Enxofre negro impuro + mercúrio + terra fétida

Ferro = Enxofre branco impuro + mercúrio + terra fétida

Estanho = Enxofre branco impuro + mercúrio + terra comum

Cobre = Enxofre vermelho impuro + mercúrio + terra comum

Prata = Enxofre branco puro + mercúrio + terra pura

Ouro = Enxofre vermelho puro + mercúrio + terra pura

 

A transmutação do chumbo (metal mais impuro) em ouro (o metal mais puro e mais valioso) é uma simbologia direta para a transmutação da pessoa do iniciado durante o seu processo iniciático. Sabemos dentro de nossa tradição que toda a trajetória de deificação, de ascensão à coroa da vida eterna, depende da dignificação da alma e do seu preenchimento em equilíbrio pelo espírito imortal – de modo que não exista mais separação entre um e outro, e a quintessência seja plenamente acessível à alma como é pelo espírito. Do mesmo modo, o chumbo se torna ouro quando seu enxofre é purificado e equilibrado ao seu mercúrio, em um sal também purificado de impurezas em perfeito equilíbrio. Os alquimistas buscam essa transmutação através de um processo que – salvo as inúmeras diferenças entre diferentes autores e diferentes épocas – pode ser explicado pelas etapas principais denominadas nigredo, albedo e rubedo (com uma subetapa por vezes chamada citrinitas).

 

Desenho de personagens

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

 

NIGREDO

Associado à cor preta (nigro) é o processo no qual a matéria se decompõe de alguma forma, putrefactio sendo o processo de “putrefação” das impurezas e calcinatio da sua incineração, a título de exemplo prático. Restam as cinzas e as impurezas são segregadas e evidenciadas, sendo separadas do restante da matéria. O chumbo é decomposto, e as impurezas da terra e do enxofre começam a ser retiradas. O enxofre deixa de ser negro e se torna branco, mas ainda está impuro assim como o sal (a terra de Magno) que ainda não é pura. Da mesma forma, no ferro o enxofre branco impuro terá que ser purificado, assim como a terra que então deixará suas impurezas.

No caminho iniciático, o nigredo começa com o aprendiz ou iniciado no estado bruto, seu caráter ainda é o “chumbo”, carregado de impurezas, vícios e desequilíbrios. Tal como esse metal pesado, o indivíduo possivelmente ainda age com padrões nocivos a si mesmo e aos demais. Alguns exemplos mais corriqueiros são os comportamentos egoístas, vitimistas ou violentos, mas também a autossabotagem, a inveja, a comparação tóxica com os outros, e os desvios de caráter que levam o indivíduo a quebrar os códigos de honra e integridade nos quais está inserido, seja mentindo para os outros ou para si mesmo, trapaceando seus semelhantes ou negligenciando suas responsabilidades.

Quando começa o processo de dissolução (a primeira fase do famoso solve et coagula) o iniciando é forçado a encarar seus desequilíbrios. Esse processo normalmente não ocorre – ao contrário do que se pode pensar – com um olhar interior imediatamente lúcido e analítico, mas com as dificuldades e obstáculos que surgem no caminho, as provações, os momentos de dificuldade e tensão que colocarão o iniciando frente à frente com os desdobramentos de suas ações, escolhas e palavras. É o momento em que as piores emoções e pensamentos virão à tona e precisarão ser reconhecidos sem identificação (com a consciência de que você não é seus pensamentos e emoções, e que eles não devem dominá-lo), e é nessa necessidade que entram em ação o iniciador e os espíritos que guiam o processo. Através da orientação dos mestres, do autoexame, da reflexão e do exercício das práticas que são ensinadas, o iniciando é malhado como ferro para ser purificado dessas impurezas. Ele identifica gradualmente seus erros, seus vícios, e os seus desequilíbrios (se estiver disposto, por óbvio), e começa lentamente a abandonar a identificação com eles, compreendendo-os como algo a ser superado, equilibrado ou purificado – algo que não faz parte de sua verdadeira essência.

Quando as impurezas são suficientemente purificadas, isto é, quando o iniciando consegue se desidentificar o suficiente dos comportamentos viciosos e nocivos, dos maus pensamentos e emoções, deixando de ser conduzido por eles cegamente como antes, a próxima fase do processo começa.

 

ALBEDO

Após o ferro, em que os primeiros estágios de purificação se mostram, vem o estanho e o cobre, onde a terra já não é mais fétida e o enxofre não é mais enegrecido. Isso implica uma materialidade mais equilibrada, porém ainda não perfeita, pois enxofre/alma ainda não estão totalmente puros. A purificação do enxofre, já em terra comum que gera o estanho e o cobre, e a elevação até a prata que é o primeiro metal que traz o enxofre puro em um sal puro, se encontra simetricamente com a segunda fase do processo alquímico e iniciático, o albedo, proveniente do alvo significando branco.

Em albedo, o iniciando já conhece suas impurezas e elas foram evidenciadas e purgadas – o processo de identificação pessoal já não ocorre como antes. Agora, as virtudes e poderes, os bons pensamentos e emoções (que são construtivos para o Opus Magnum – a grande obra do alquimista) e a verdadeira e valorosa essência do ser começam a ser enaltecidos. A identificação que antes ocorria com os aspectos impuros e problemáticos começa a acontecer com o os aspectos construtivos de si mesmo. A alma começa a refletir a luz do espírito (enxofre começa a se tornar fluido e constante como o mercúrio), tal como a lua reflete na noite a luz do sol. Em albedo, o iniciando começa a desenvolver de forma proativa suas qualidades pessoais, como um bom caráter, integridade e cumprimento da honra, honestidade consigo e os outros, mais lucidez sobre as situações ao seu redor etc. Também em albedo os dons que antes estavam adormecidos ou obscurecidos pelas impurezas espirituais e psíquicas começam a ser percebidos. Enquanto nigredo evidencia os problemas e os defeitos, albedo evidencia as soluções e as qualidades, de modo que o iniciando então passa a ser consciente de aspectos construtivos de sua verdadeira essência, e da tangibilidade de seu real potencial. Volta mais uma vez o papel essencial do iniciador e dos espíritos do caminho – e num certo sentido até mesmo da comunidade – como guias nesse processo de reivindicação de dons, virtudes e qualidades do iniciando. É na conquista orgânica desse potencial que alguns definem a subetapa citrinitas (amarelamento), como o início da contaminação da alma pelo poder do espírito, o início do equilíbrio entre enxofre e mercúrio alquímicos.

Essa certeza sobre quem se é, construída gradualmente, levará ao derradeiro processo de comunhão que caracteriza a terceira etapa da alquimia.

 

RUBEDO

A consumação das “núpcias alquímicas” entre enxofre e mercúrio, entre alma e espírito, se dão em rubedo, significando rubro, vermelho. A pureza da prata com seu enxofre branco leva ao ouro quando o enxofre já puro em terra pura se torna vermelho pelo influxo dos raios solares (aqui se entende o sol como o divino, o espírito quintessencial). O que antes ainda recebia influência profana – da “terra comum” – passa a ser um sentimento e um intelecto puro, essencialmente divino em plena manifestação.

O iniciado em rubedo atinge a comunhão e o equilíbrio do alinhamento entre alma e espírito imortal, e as virtudes e poderes que começam a ser percebidos em albedo se manifestam de forma concreta, assim como o domínio maior sobre os demônios interiores que se escondiam entre as impurezas purgadas em nigredo. Aqui o bom caráter que foi forjado se define e se consolida como natural, os dons atingem sua plena maturação e serventia, e a gnose – o ganho de conhecimento espiritual – também. É o grande esplendor do iniciado, que se torna não apenas uma versão melhor de si mesmo (algo que idealmente começa desde o início em nigredo) mas também se torna capaz de manifestar plenamente a sua verdadeira essência. Aqui a autenticidade do espírito é vista, e tal como o brilho do sol que nutre a vida, a emanação dessa autenticidade abençoa as pessoas ao redor do indivíduo de forma bem mais direta e abrasiva do que a tênue luz que era refletida por ele em albedo.

Ao consumar o processo, o iniciado terá unido com sucesso o céu e a terra, seus aspectos inferiores e superiores, instinto e intelecto, alma e espírito imortal, perfazendo a consolidação do que é prescrito pela Tabula Smaragdina, a Tábua das Esmeraldas:

 

Verum sine mendacio, certum, certissimum.
Quod est superius est sicut quod inferius, et quod inferius est sicut quod est superius.
Ad preparanda miracula rei unius.
Sicut res omnes ab una fuerunt meditatione unius, et sic sunt nate res omnes ab hac re una aptatione.
Pater ejus sol, mater ejus luna.
Portavit illuc ventus in ventre suo.
Nutrix ejus terra est.
Pater omnis Telesmi tocius mundi hic est.
Vis ejus integra est.
Si versa fuerit in terram separabit terram ab igne, subtile a spisso.
Suaviter cum magno ingenio ascendit a terra in celum. Iterum descendit in terram,
et recipit vim superiorem atque inferiorem.
Sicque habebis gloriam claritatis mundi. Ideo fugiet a te omnis obscuritas.
Hic est tocius fortitudinis fortitudo fortis,
quia vincet omnem rem subtilem, omnemque rem solidam penetrabit.
Sicut hic mundus creatus est.
Hinc erunt aptationes mirabiles quarum mos hic est.
Itaque vocatus sum Hermes, tres tocius mundi partes habens sapientie.
Et completum est quod diximus de opere solis

 

TRADUÇÃO:

É verdade, sem falsidade alguma, certa e mais verdadeira

Que aquilo que está acima é como aquilo que está abaixo, e que aquilo que está abaixo é como aquilo que está acima.

Para realizar os milagres de uma única coisa.

E assim como todas as coisas vieram do Um, assim todas as coisas são únicas, por adaptação.

Assim o Sol é seu pai, e a Lua é sua mãe.

O vento a carregou em seu ventre, e a Terra e assim sua nutridora.

O Pai de toda Telesma (vontade) do mundo está nisto.

Seu poder é perfeito, se for convertido em terra.

Separarás a Terra do Fogo, o sutil do denso, suavemente e com grande sagacidade.

Sobe da terra para o Céu e desce novamente à Terra e recolhe a força das coisas superiores e inferiores.

Desse modo obterás a glória do mundo inteiro.

E todas as trevas se afastarão de ti.

Nisso consiste a forte fortaleza de todo poder:

Vencerás todas as coisas sutis e penetrarás em tudo o que é sólido.

Assim o mundo foi criado.

Esta é a fonte das admiráveis adaptações aqui indicadas.

Por esta razão fui chamado de Hermes Trismegisto, pois possuo as três partes da filosofia do mundo.

O que eu disse da Obra Solar é completo.

 

ROTATIO – A repetição cíclica

A jornada iniciática assim pode ser compreendida tanto em macro quanto em microescala. Na macro, nigredo, albedo e rubedo são as etapas de um caminho iniciático funcional e bem vivido. O iniciando migra de um para outro ao longo de muitos e muitos anos de prática, consolidando seus dons, virtudes e forjando pelas pressões e intercorrências do caminho o seu amadurecimento. Mesmo depois da vida, esse processo continua, e o seu ápice se dará na apoteose da vida eterna, na deificação – que podemos equiparar à obtenção da verdadeira Pedra Filosofal, a imortalidade absoluta, a sabedoria plena, chamada de A Grande Obra (Opus Magnum). Já em microescala, as etapas negra, branca e vermelha se repetem constantemente todos os dias, de mês em mês, de estação em estação. É o curso do próprio caminho que viabiliza que sucessivas vezes tenhamos que aniquilar nossas impurezas e enfrentar nossas fraquezas, aprender a identificar nossas virtudes, e integrá-las em nosso eu para florescer o pleno potencial que possuímos. Deste modo, o labor nunca está de fato concluído. Não existe um momento na vida de um iniciado, mesmo após muitos e muitos anos, em que não exista mais trabalho a ser feito, em que não exista mais impureza a expurgar, virtude a enaltecer e integração do alto e do baixo a equalizar. Se esse momento chega, ele é a divinização plena, e sabemos o quão excepcional – e improvável – é a aquisição dessa coroa de vida eterna no curso de uma única vida humana.

Deste modo, o alquimista deve repetir as operações de dissolução e coagulação – solve et coagula –, de nigredo a rubedo, inúmeras vezes, cada vez em um nível mais sutil, para aperfeiçoar a obra. A isso, pode-se dar o nome de rotatio (rotação), a repetição cíclica do processo em círculos intermináveis, à imagem do Ouroboros – a serpente ou dragão alquímico que come a própria cauda infinitamente. O dragão representa também a coragem necessária para devorar a si mesmo em nigredo, a dor do crescimento e amadurecimento em albedo e a união dos opostos – cauda e cabeça – em rubedo. O dragão é também a serpente cósmica [conteúdo editado] o fluxo do poder divino por todo o cosmos, e um simbolismo profundo da máxima alquímica Hen to Pan – Ἓν τὸ Πᾶν – que significa que o Um está no Todo e o Todo está no Um.

 

Imagem digital fictícia de personagem de desenho animado

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

 

 The Ouroboros is a fascinating ancient symbol depicting a serpent or dragon  eating its own tail, forming a circular image that symbolizes the eternal  cycle of destruction and rebirth. Its origins can  Imagem digital fictícia de personagem de desenho animado

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

 

Uma imagem contendo tatuagem

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

 

Inspirado por essa simbologia, o iniciado deve lançar mão do conselho contido na fórmula alquímica do V.I.T.R.I.O.L, a frase Visita Interiora Terrae Rectificando Invenies Occultum Lapidem, que significa “visita o interior da terra e, retificando, encontra a pedra oculta”. Essa frase sintetiza o conselho da Tábua das Esmeraldas e aponta o caminho da Pedra Filosofal – a pedra oculta. Esse caminho se dá pela retificação interior, à qual o iniciando se submete num ciclo interminável, cada vez mais apurado, em que sofre as transmutações de nigredo a rubedo.

Visitar o interior da terra implica o conhecimento do seu próprio interior, assim como dos mundos inferiores – em nossa tradição, o mergulho ao Inferno em práticas sabáticas, o congresso com o demônio pessoal, e a própria pactuação com Lucifero entram aqui, pois é impossível conhecer o Paraíso sem ter descido ao abismo do Inferno. [conteúdo editado] Retificar, significa expurgar as impurezas, e realinhar espírito e alma – podemos observar isso à luz da procura pelo cumprimento da missão escolhida por nosso sagrado coração ou espírito imortal para esta vida presente. Encontrar a Pedra Filosofal, para além da pedra física e suas propriedades que são buscadas por alquimistas operativos, inclui encontrar a própria verdadeira essência de si mesmo, o ouro filosofal, a sua natureza divina que sobreviverá a todo o restante, e por isso pode divinizar a alma em que habita, entregando – tal como se diz da pedra física – imortalidade, cura de todas as mazelas e infinita sabedoria.

Estas são noções introdutórias acerca da alquimia que se espera que ocorra no processo iniciático. Como em nossa tradição não possuímos um trabalho ritualístico específico para isso que obrigue o iniciando a forçosamente se abrir para tais reflexões, se faz necessário que essa abertura ocorra pela reflexão quotidiana, pela compreensão do seu próprio amadurecimento conforme se avança na caminhada. Subliminarmente, a movimentação dos ritos e dos sacramentos, a desenvoltura dos dons e o próprio efeito das ressonâncias e transmissões iniciáticas tem a função de provocar o início e a continuidade dessa alquimia – mas de nada ela adiantará se a mente não estiver disposta a enxergar e assimilar com reverência e respeito, por si mesma e pelos que gastam seu tempo orientando a caminhada na tradição.

Um dos muitos perigos de processos do gênero “autoconhecimento” é achar que você está atravessando grandes mudanças, ou que se tornou um grande pedaço de ouro reluzente, enquanto continua em realidade preso às impurezas que deveria purgar em nigredo, e essa é uma das razões pelas quais temos que ser pacientes e persistentes, e jamais soberbos. Autoconhecimento, assim como a “forja do caráter” são processos que duram uma vida – em realidade mais do que uma vida – e que se operam e se viabilizam pela experiência vivida, pelos acertos e erros, e pela opção de estar aberto à orientação e à reflexão por toda a extensão da jornada. Fujam de quaisquer ilusões de que após uma série de práticas vocês estarão à beira da deificação. Lembrem-se de que quando realmente optamos por vivenciar a iniciação – ou melhor, a jornada iniciática – a alquimia pessoal vai acontecer em círculos concêntricos como já explicado. Você atravessará fases que vão do nigredo ao rubedo diariamente, em pequenas coisas, em pequenas batalhas, mudanças e vitórias, e elas são importantes. Mas é a união desses pequenos ciclos diários ao processo em sua escala macro que fará de você um verdadeiro iniciado, capaz de encontrar sua verdadeira essência e manifestá-la no mundo.

Então, quando achar que encontrou a Pedra Filosofal, procure mais atentamente. De novo. E de novo. E de novo. Esse é o caminho para efetivamente rumar em direção a ela. E é essa a postura honrada que é esperada de um iniciado: procurar o aperfeiçoamento contínuo, orando e trabalhando (como se diz com o conselho dos alquimistas Ora et Labora), sem jamais se permitir a ilusão de acomodação ou a cegueira do orgulho pelas coisas que foram conquistadas até o presente. Intimide-se sempre pelo seu eu de amanhã, pois fazendo um bom trabalho, ele será muito maior e mais nobre do que o de hoje! A verdadeira competição é com seu eu do passado e seu eu do presente. O único verdadeiro adversário a superar – pois é o único que realmente pode impedir o seu progresso iniciático – é você mesmo.

Tal como o dragão em ouroboros, a jornada não possui um fim, e o único caminho é em frente, entre a esquerda e a direita.

Que vocês, iniciados ou aprendizes, se lembrem disso e seja a lembrança uma chave para abrir o caminho para o que vocês realmente buscam.

 

Diagrama

O conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário